Dizem que ressaca dói, deixa o
cara baqueado, sem vontade de nada. Dizem que ressaca moral dói mais ainda,
tira o ânimo e a coragem até de sair de casa. Agora dizem que a pior ressaca é
aquela pós-separação. Ih, meus amigos, que já passaram por isso, viviam me
assustando, como que prevendo. “Você vai cair de cama, chorando, enquanto ela
vai se divertir. Se prepara pra ver as fotos no Facebook”, entre outras
palavras de consolo de amigos de verdade.
Ainda não sei se isso é verdade,
até acordei bem, depois de ontem. O jantar foi indigesto, o último. Mas uma
coisa eles acertaram: voltei um analfabeto. Dois anos de namoro, mais uns meses
de insistência, outros dois de pura burocracia, e eu me vejo um completo
ignorante. Voltei desaprendido, até mesmo burro. Esse negócio de amor deixa a
gente meio lesado, e pior, sequelado.
Claro que eu fiquei triste com o
desatar de um laço tão duradouro, mesmo frouxo há algum tempo. Porém, o que me
tirou o sono foi esse arquivo velho dos meus tempos de solteiro. Faz tempo,
tanto tempo, que eu desaprendi tantas coisas comuns sobre a vida, sobre garotas
e esse mundo tão banal. Sim, preciso de uma cartilha, atualizada, da solidão
colorida. Nem sei quais são os bares legais pra curtir e azarar... Acho que
“azarar” ficou ultrapassado.
É disso que eu falo. Eu nem
consigo me portar perante as mulheres soltas, sou um perdido na pista, nem
consigo ter a cara de pau de outrora, na hora de pegar um telefone. Enferrujei
sem envelhecer. Tenho amigos, eles vão me guiar, por essa redescoberta das
noites boêmias dessa cidade, que ganhou cor nos últimos minutos. É estranho,
sou estranho, mas vou me adaptar. Eu acho.
Vai ser bom. Sair sem dar
satisfações, comer o que quiser, largar a toalha molhada no sofá, o rodízio de
perfumes na minha cama... Acho que agora começo a enxergar, de fato, o que
voltei a ser. Liberdade? Talvez sim. Talvez. Noites sem conversas longas ao
telefone, mensagens frias, sem “eu te amo” ou outras frases melosas, feriados
sem companhia, filmes e pipoca.
Será que era tão ruim assim? Será
que eu quero mesmo me desacostumar com os rituais de um quase-noivado, um
passado recente, ainda quente? Não sei. Ganhei a chance de viver minhas
amizades sem limites de tempo, lugar e teor alcoólico, e perdi a encrenca de
dar explicações no domingo à noite. Tenho a meu favor a juventude, mas contra
mim há a experiência. Estou livre da liberdade que me prendia. E agora?
[...]
Tanto faz. Acabei de receber uma
mensagem, um convite, churrasco na casa do Marcão, com a galera toda. Hora de
levantar, viver o fim de semana e sentir o gosto de outras ressacas.
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IMAGEM: http://www.chivalryclub.com.br/blog/wp-content/uploads/2010/11/ressaca-1.jpg
Um comentário:
Quem nunca teve uma ressaca dessas que atire a primeira garrafa de Orloff.
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