Era uma manhã qualquer de
fevereiro ou março, quando aquela rotina começou. Uma onda, que contrariou a
Física e carregou matéria, de um mundo lá fora ao mundo aqui dentro,
atravessando uma vida de espera tácita, oculta, onírica para alguns. Pra quem
entrou ali com receio, tímido, pensando que seria alvo de julgamentos, apenas
pelo fato de serem estranhos no ninho, até que nos adaptamos bem. Contamos com
ajudas pra isso.
Não demorou nada. Quando vimos,
aqueles lugares eram nossos, o chão era nosso quarto, a luz era um acessório
pra nossas conversas, e as vozes já se cruzavam, formando um bizarro coro dos
contentes, por ali estarem. Casa? Era a terceira, ou segunda. Ou mesmo a
primeira de muitos ali, que dormiam e acordavam ali, com a mesma liberdade do
sofá da sala. Era só jogar os tênis e desmaiar. A certeza de acordar com algum
dos seus ali, ao lado, falando ou tocando violão, era o bastante pra fazer
ficar.
Ficamos. Ficamos tanto, mas
tanto, que até ousamos a desenhar um “pra sempre” naquelas paredes, cheias de
gravuras, fotos e marcas do nosso tempo e de outras épocas. Acreditamos nisso.
Acreditamos na eternidade de uns abraços, na força de palavras, na vida longa
das atitudes. Salvo alguns racionalóides, ou talvez céticos, todos nós perdemos
de vista a realidade, de que tudo, um dia, mudaria de estado. As coisas são
assim. Transformação.
Hoje, não apenas hoje, bate a
nostalgia, em quem também mergulhou nessa imensidão ilusória do “pra sempre”, e
enxerga com tristeza a verdade. Nós mudamos, amigos. E muito. Alguns nem nos
reconhecem, ou nem conseguem se ver como antes. A vida é dura, e o tempo é
cruel demais, com tantos parentes dessa família imensa, que se dividiu, se
repartiu, se segregou.
Não é hora de apontar culpas ou
culpados. Cada caminho começou a se separar, ou desmagnetizar, e o que era um
grande bolo se dividiu em pratinhos de brigadeiro. Um todo que se transformou,
deu origem a partes até mais sólidas, mais fortes. Saldo positivo. Mesmo assim,
aquele todo faz falta. E não falo de amizades verdadeiras, eternas, blá blá
blá. Falo da companhia, do “nada pra fazer” de toda tarde, do canto desafinado,
das risadas, das frivolidades de uma juventude que se descobre a cada dia. Quem
é que consegue viver sem besteiras?
As circunstâncias fecharam, por um tempo, esse
lugar, esse mundo, que nos acolheu com carinho e aconchego. E agora, quem voltará? Cada um no seu canto, vivendo suas próprias carreiras,
suas vontades, seus sonhos, aqueles que nos trouxeram e, consequentemente, nos
uniram por aqui. Quando ele for reaberto, quais serão os cacos a reconstruir o
passado, e evitar que o “grande encontro da turma” demore demais, se possível
for? Quando ele for reaberto, quem mais terá o privilégio de construir a mesma
história, mais uma vez, como há tanto tempo nós fizemos?
2 comentários:
Seu rídículo! Te odeio! u.u
A nossa eterna utopia do para sempre inseparáveis.
Mas, cada um de nós constrói em comunidade um destino para si mesmo. Cedo ou tarde, as consequências surgem!
Bela reflexão, moço!
Abração.
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